Nos últimos dias, as redes sociais foram inundadas por uma nova febre: transformar fotos comuns em imagens estilizadas como se fossem obras do icônico “Studio Ghibli”, utilizando inteligência artificial. Segundo o site G1, a trend rendeu à ferramenta utilizada nada menos que 1 milhão de novos usuários em apenas 1 hora. Uma verdadeira façanha quando se trata de estratégia mercadológica.
Mas, até onde essa prática é juridicamente legítima? E quais os riscos para quem entra na “onda”?
A Tendência e o direito autoral
Transformar fotos em estilo Ghibli é fascinante e nostálgico para os amantes de obras como Meu Amigo Totoro e A Viagem de Chihiro. Contudo, a estética característica do Studio Ghibli é protegida por direitos autorais e, potencialmente, por direitos de marca.
A utilização desse estilo por IA sem autorização do estúdio pode configurar violação de direitos autorais se houver cópia não autorizada ou derivação direta de obras protegidas. Além disso, o uso massivo de uma identidade visual consagrada pode esbarrar em questões de concorrência desleal, principalmente se for utilizado com objetivos comerciais (caso da própria empresa responsável pelo ChatGPT).
Direito de imagem e consentimento
Outro ponto que desperta preocupação é o uso de imagens de usuários. A inteligência artificial é treinada com grandes volumes de dados visuais, o que levanta questões não apenas sobre a qualidade do consentimento informado, se todas as informações relevantes foram devidamente comunicadas aos usuários, mas também sobre onde esses dados são armazenados, como são utilizados e por quanto tempo permanecem disponíveis.
Tanto no Brasil, quanto fora dele, o uso de dados pessoais, incluindo imagens, é regulado por leis rigorosas de privacidade, como a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) no Brasil e o GDPR (General Data Protection Regulation) na União Europeia. Se a plataforma utiliza essas imagens para aprimorar seu modelo de IA sem informar adequadamente o usuário, pode estar infringindo tais normas.
Legislação no Brasil e no mundo
O uso de IA e seus limites legais estão sendo cada vez mais debatidos e regulamentados.
Brasil
No Brasil, atualmente há um Projeto de Lei (PL 21/2020) que tramita no Congresso Nacional e busca estabelecer um marco regulatório para a inteligência artificial. O projeto visa criar normas gerais sobre o uso seguro e ético da IA, com princípios como respeito aos direitos humanos, não discriminação e proteção de dados. Além disso, propõe diretrizes específicas para o uso responsável de sistemas de IA em setores sensíveis, como saúde, educação e segurança.
União Europeia
A União Europeia está no pioneirismo da regulamentação de IA com a proposta do AI Act, apresentada em 2021. O AI Act estabelece uma abordagem baseada em risco, categorizando sistemas de IA em quatro níveis: risco inaceitável, alto risco, risco limitado e risco mínimo. Sistemas de alto risco, por exemplo, precisam cumprir requisitos rigorosos de transparência, segurança e supervisão humana.
Estados Unidos
Nos Estados Unidos, não existe uma legislação federal específica para IA, mas algumas iniciativas estaduais, especialmente na Califórnia, têm avançado em regulamentações sobre o uso ético e responsável da IA, especialmente no que diz respeito à privacidade e ao uso de dados pessoais.
Liberdade criativa vs. proteção legal
O uso de IA para criar obras que imitam estilos consagrados levanta questões interessantes sobre liberdade criativa e proteção legal. De um lado, temos a possibilidade de inovação e democratização da arte, com usuários comuns podendo criar obras visualmente sofisticadas. Por outro, há o desafio de garantir que essa inovação não infrinja direitos alheios.
No campo jurídico, o uso de IA para gerar imagens estilizadas é considerado legal desde que não haja reprodução exata ou uso não autorizado de obras protegidas; os termos de uso da plataforma sejam claros quanto ao uso das imagens fornecidas pelos usuários e haja transparência sobre o treinamento da IA e o uso dos dados fornecidos.
A tendência de usar IA para criar obras no estilo Ghibli é inovadora e reflete o fascínio do público por novas possibilidades tecnológicas. No entanto, a legalidade dessa prática depende de um equilíbrio cuidadoso entre criatividade, direitos autorais e proteção de dados.
Antes de mergulhar em qualquer trend que envolva IA e elementos protegidos por direitos autorais, é fundamental compreender os limites legais e agir com responsabilidade. Afinal, inovar é incrível, mas inovar legalmente é necessário.
Importante mencionar que, devido às preocupações legais e éticas levantadas, a geração de imagens utilizando o estilo “Studio Ghibli” foi suspensa no dia 28 de março de 2025.
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